Filmes de 2024 - Vasco
(este filme aparece mais tarde na publicação, mas escolho-o aqui para sinedocar o ano para encorajar-nos a continuar a tentar encontrar algo que cintile em todos os futuros anos desta rançosa doença que é a cinefilia de que já não escapamos)
Para facilitar a vida, não tanto ao leitor, mas mais a mim mesmo, vou dividir esta retrospetiva em três pequenas listas
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Os dois melhores filmes que vi este ano: filmes em que penso recorrentemente, que consigo dizer facilmente que são dos meus favoritos que já vi na minha vida. Nestes nem deixo legenda porque de momento pedem-me para me calar. Escreverei algo sobre eles eventualmente, mas terá de ser num fomato mais extenso do que uma legenda curta (quando me sentir capaz de aprimorar o que agora seria só verborreia).
Ruby Gentry, (1952), King Vidor
Corps à Coeur, (1979), Paul Vecchiali
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Seis filmes de anos passados vistos pela primeira vez este ano:
-7 Women, (1966), John Ford
Vi duas vezes em Dezembro. Continuo ofendidíssimo pelo facto de ninguém me ter dito que o Ford tinha acabado a carreira com um filme, não só perfeito em si mesmo, mas também perfeito para doentes de propensão histérica e bichas arreliadas (como eu).
-Inserts, (1975), John Byrum
Regressa ao teatro para fazer o elogío de óbito do cinema. Teatro filmado não é cinema puro, mas é puramente cinema. Uma revolução é declarada numa desafiante dedicação à impureza. Cinema é uma arte impura, e no estado mais impuro em que já esteve, esta é a mais bela peça de teatro já encenada, e o mais belo filme já filmado.
(...) Mas tudo isto irá, no fim, ser apenas teatro, teatro sublime, e nada mais...
-Louis Skorecki
-Son nom de Venise dans Calcutta désert, (1976), Marguerite Duras
É muito especial finalmente ver finalmente este baú de fantasmas pela primeira vez, depois de já ter visto o India Song tantas vezes antes. Ainda mais especial continuar a ser surpreendindo - tal como me continua surpreender quando revejo o filme irmão - pelo quão mais cedo do que me lembro se dá o grito, e pelo quão mais longa é a sua duração (e o tempo da sua infeção ectoplásmica no resto do filme).
-Il Bacio di Tosca, (1984), Daniel Schmid
Acho que nunca chorei tanto com um filme. Não foi só na sala. Foi no caminho para casa sozinho também. E ainda mais: durante semanas depois de o ver, continuava a ter ataques de choro inesperados causados por gestos e cenas do filme que saltavam repentinamente de trás dos arbustos da minha memória ainda fresca para me atacar.
-Les Cinéphiles 1+2: Le retour de Jean/Eric a disparu, (1989), Louis Skorecki
Um estudo etimológico duma linguagem in extremis. Tão triste quanto caloroso e engraçado. Um riso que não aponta o dedo nem à personagem nem ao espetador. Skorecki não está aqui a armar-se em moralista tentando fazer-nos reconhecer a culpa que deviamos sentir pelo nosso riso que nos implica nesta doença - só se ri quem entende. Isto porque também só consegue alguém filmar o seu humor entendo-o direito e do avesso. E ele sabe tanto isso, como também não nos desrespeita assumindo que não temos noção. Estamos nós, o Skorecki e estes amigos de mãos dadas no mesmo barco fúnebre.
-Weak Rangers, (2022), Lucía Seles
Os raios de luz que nos chegam tendo conseguido atravessar as frestas e furos do grande tecido cinzento e abafado que cobre o céu como visto da terra. Estes raios de luz que são o que faz com que seja possível viver.
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Seis filmes estreados em 2024:
Stress Positions, Theda Hammel
Por todos os novelos narrativos que vemos na vida, extraímos dela, ou nela impomos. A sua necessidade absoluta e a opressão nada escondida que anda sempre de mão dada. Que não nos ceguemos seletivamente face a nenhum destes lados, e que não abdiquemos de algo tão importante só pela dificuldade da luta que lhe é intrínseca.
Trap, M. Night Shyamalan
Porque o Shyamalan é dos únicos discípulos de Hitchcock que realmente compreendeu, e continua a compreender, que o seu mestre não era apenas um estilista, ou um mestre de cerimónias de circo, mas também um filósofo moral cósmico.
Paixão Sinistra, João Pedro Faro
Porque não tem medo da vida que há no mundo (nas ruas!) em que os filmes são filmados, e da possibilidade de ela entrar e participar dentro da encenação ficcional em curso.
Terrifier 3, Damien Leone
Porque o cinema católico está vivo e fulgurante, violento sem qualquer das hipocrisias de pornochanchadas como o Passion of the Christ. Como Godard dizia do Mouchette e se vê aqui de forma tão honesta e despojada: "un film chrétien et sadique".
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